Cumprimentos
Agradeço
à oportunidade dada pela Casa de Cultura, para essa pequena análise
de nosso bardo caixense. Se interessar a alguém. Disponibilizarei os
textos lidos aqui e a análise em meu twitter & blog professoral
(@aulasetextos e http://aulasetextos.com
).
Considerações
Por
que se estudar Gonçalves Dias?
Marabá
Mme.
Bovary c'est moi
Essa
origem mestiça causou grande frustração na sua vida impedindo-o de
se casar com Ana Amélia e que aparentemente o poeta jamais se
recuperaria desse evento. A frustração experimentada por essa índia
também é a mesma frustração experimentada pelo próprio poeta que
é impedido do amor verdadeiro por sua origem mestiça.
Contexto
SERA,
Tânia. Indianismo:
Evasão E Participação No Romantismo Brasileiro in
http://repositorio.unb.br/bitstream/10482/3731/6/ARTIGO_IndianismoEvasaoParticipacao.pdf
<acesso em 20/05/2015>
Para
podermos compreender o fenômeno literário do Indianismo, é
necessário voltarmos alguns séculos para trás na História
e vir mapeando o desenvolvimento dessa corrente do primeiro
Romantismo brasileiro, a fim de podermos verificar sua
identidade profunda com o nacionalismo que ocorreu nas
primeiras décadas de nossa Independência e que não pode ser
eliminado de uma análise sobre aquele período. E necessário,
também, termos em mente que há duas correntes de influência
paralelas nesse correr dos séculos, a saber: a literatura
colonial do tipo exótico-ufanista, principalmente os poemas épicos
do Barroco brasileiro (juntamente com sua prima próxima, a
literatura de viagem),e a noção filosófica do ameríndio
como um Adão em estado de pré-queda, espécie de embasamento
teórico para o Americanismo que vai eclodir na França do começo
do século XIX. Do ponto de vist a político, encontra-se aí
uma enorme efervescência em seguida à Revolução Francesa,
conforme já disse Carpeaux. É a época do liberalismo, tanto
político quanto social, e até mesmo literário: "O
Romantismo ... é o ... 'liberalismo em literatura'", diz Victor
Hugo em seu prefácio a Hernani. É também, e sobretudo, a
época em que camadas sociais antes reprimidas aspiram a uma faixa
de poder. A burguesia luta por um lugar ao sol, e a ideologia dessa
atitude vai refletir-se no movimento romântico. É essa mesma
burguesia que, durante o Renascimento e as grandes descobertas,
vai colocar seu olhar "civilizado" sobre os bárbaros das
Américas e elegê-los como o ponto de partida para um
neobucolismo necessário à nova ideologia financeiramente
interessada de uma Europa em rápido processo de urbanização,
que irá desembocar na Revolução Industrial e na Revolução
Francesa do Século XVIII.Montaigne, Rousseau e Chateaubriand,
cada qual com sua visão particular, forjam o arquétipo
do novo Adão paradisíaco, a saber, o índio americano; o bon
sauvage. O Americanismo de Chateaubriand — e mais tarde o de
Cooper — chega-nos num momento em que o olhar dos
viajantes mercantilistas já havia registrado o exotismo do
ameríndio, a exuberância da natureza tropical, a virgindade
e a extensão das terras brasílicas. Nossa épica barroca
está cheia de exemplos do ufanismo com que a terra e a
gente eram visualizadas pelos poetas. Desde Anchieta já se
pode falar de uma visão nativista, ou melhor, indigenista do
nosso índio. Por esse caminho seguem Santa Rita Durão, com seu
Caramuru, ou Basílio da Gama n'0 Uraguai, e até mesmo
Sebastião da Rocha Pita na prosa de seu barroquíssimo A
História da América Portuguesa.
Fazendo
com que as correntes paralelas que influenciaram
nosso Indianismo se encontrem, o francês Ferdinand Denis, primeiro
em 1824, depois em 182ó, publica livros em que fala de uma
literatura brasileira. O Resumo da História Literária do Brasil
(de 1826) é o primeiro documento de história literária
mencionando não só uma literatura nossa, como sugerindo que
ela poderia ser muito mais viçosa se seguisse o caminho indianista,
agora que o país conseguiu uma situação ideal, pois desde 1822 se
havia libertado de Portugal. O que vemos acontecer, nessa
primeira metade do século XIX, é uma tentativa sistemática
de erigir essa independência sobre bases
sólidas, isto é, autenticamente nacionais. O nacionalismo
será, então, o que dará o tom a todas as manifestações
político-culturais no país; "a literatura romântica foi
arma de ação política e social desde a independência"
(Coutinho, 1976: 169). É também o momento em que vários
países da Europa se estão formando como nação,
onde
antes havia ducados e principados separados, como a Itália e a
Alemanha, por exemplo. No Novo Mundo, é quando começam as guerras
de Independência, inspiradas na dos Estados Unidos da América no
final do século XVIII.Esse sentimento também chega ao Brasil.
É preciso, portanto, "fundar" urgentemente uma
literatura brasileira, não mais referida por estrangeiros, mas
por filhos da nova terra independente. Se, no entanto, desde a
época do Brasil colônia tivemos cantos celebrando as belezas
e excelências da terra, estes são mais manifestações
nativistas do que nacionalistas.
O
terreno estando semeado pelas duas correntes — o exotismo ufanista,
que possibilita o mito da terra propícia à literatura, e
o arquétipo do bon sauvage, que vai desembocar no paradigma do
homem perfeito -, elas acabam tocando-se e misturando-se no começo
do Primeiro Reinado. Agora, só nos falta uma ideologia própria
que, separando-se das matrizes européias, alcance
vôo-solo. Essa manifestação de nacionalismo literário - o
nosso Indianismo, que vai, grosso modo, de 1840 a 1860 -
foi ideologicamente legitimada por Domingos José Gonçalves de
Magalhães no seu interessantíssimo e curioso "Discurso
sobre a Literatura do Brasil", publicado na revista
Niterói, em Paris (!), no ano de 1836, e que pode ser
considerado nosso primeiro manifesto romântico. Nesse ensaio,
que deveria servir de introdução a uma história da
literatura brasileira, que nunca veio à luz, o futuro Visconde de
Araguaia lança as cinco premissas que permitirão ao
jovem país criar um fundamento "iítero-ideológico"
que lhe possibilitaria executar um programa inovador de
cultura, não mais luso, mas euro-brasileiro. Um pouco o que
Oswald de Andrade, quase um século depois, vai realizar no nosso
Modernismo.
Nosso
Indianismo vem, então, preencher requisitos do exotismo e
do nacionalismo literários. Segundo Nelson Werneck Sodré,
o fenômeno da idealização do índio, uma das características
fundamentais daquela corrente do Romantismo brasileiro como
manifestação literária, sobretudo na poesia, também existe desde
o século XVI. Nos capítulos em que trata de Indianismo, na sua
ainda bastante pertinente História da Li-teratura Brasileira,
o historiador traça a trajetória da mitificação do
aborígene na sociedade branca ocidental até o Século das
Luzes, quando aparece a idéia do bon sauvage de Rousseau,
seguindo-se a literatura americanista de evasão baseada nos heróis
ameríndios de Chateau-briand, como já foi dito anteriormente.
José
de Alencar, na prosa de ficção, e Gonçalves Dias, na poesia, são
os dois maiores representantes do Indianismo. São os Primeiros
Cantos, publicados em 1847, que vão popularizar de vez a tendência
que outros poetas menores já manipulavam.
O
vate maranhense é considerado até hoje como "o poeta
nacional" (Martins, 1978: 348). Faz parte do que se
convencionou chamar de a Primeira Geração Romântica, ainda com
fortes influências da forma clássica, mas já com uma temática
que reflete o país a emergir da sombra de Portugal. É
ele quem começa oficialmente o Indianismo no Brasil, com a
publicação da obra acima mencionada. Toda uma primeira parte é
chamada de "Poesias Americanas", e o poeta vai conhecer
enorme sucesso, entrando para o círculo restrito dos jovens
escritores que freqüentavam o exclusivo Paço Imperial,
como o próprio Gonçalves de Magalhães e Joaquim de
Macedo, por exemplo. O Imperador Pedro II vai até mesmo
pedir-lhe que faça alguns estudos etnográficos, a partir
do
recém-fundado Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro
de 1838 -, que resultam, por exemplo, na monografia "Brasil e
Oceania", de 1856, curiosíssimo trabalho em que Gonçalves Dias
compara os índios brasileiros e os aborígenes australianos,
chegando à conclusão de que os nossos são
infinitamente "melhores" que os outros, por sua docilidade
e pela facilidade com que deixam os hábitos pagãos. Esse interesse
pela etnografia é muito sintomático, pois mostra a enorme
curiosidade despertada pela população indígena e seus costumes,
embora, nessa época, o genocídio das populações
autóctones americanas já estivesse praticamente consumado.
Mas é a partir desses dados colhidos que se vai poder criar uma
idealização do homem-índio-Adão primitivo, padrão de homem
honrado e valente que pode ser, então, comparado ao
cavaleiro medieval: "O indianismo de Gonçalves Dias ...
é parente do medievismo coimbrão ... As Sextilhas de Frei
Antáo ... [e] "O Trovador" (poemas medievistas),
poder-se-iam considerar pares simétricos d'Os Timbiras, do
"I-Juca-Pirama", ... pela redução do índio aos padrões
da Cavalaria" (Cândido, 1975: 84).
Esse
novo herói será extremamente popular, fornecendo — para o público
fluminense e o das províncias o caldo de nacionalidade
necessária para unir a grande euforia cívica que se segue
à Independência sobretudo no Segundo Reinado, o acréscimo de
algo genuinamente nacional: uma identidade cultural brasileira.
Composição
Gonçalves
Dias (Antônio G. D.), poeta, professor, crítico de história,
etnólogo, nasceu em Caxias, MA, em 10 de agosto de 1823, e faleceu
em naufrágio, no baixio dos Atins, MA, em 3 de novembro de 1864. É
o patrono da Cadeira n. 15, por escolha do fundador Olavo Bilac.
Era
filho de João Manuel Gonçalves Dias, comerciante português,
natural de Trás-os-Montes, e de Vicência Ferreira, mestiça.
Perseguido pelas exaltações nativistas, o pai refugiara-se com a
companheira perto de Caxias, onde nasceu o futuro poeta. Casado em
1825 com outra mulher, o pai levou-o consigo, deu-lhe instrução e
trabalho e matriculou-o no curso de latim, francês e filosofia do
prof. Ricardo Leão Sabino. Em 1838 Gonçalves Dias embarcaria para
Portugal, para prosseguir nos estudos, quando faleceu-lhe o pai. Com
a ajuda da madrasta pôde viajar e matricular-se no curso de Direito
em Coimbra. A situação financeira da família tornou-se difícil em
Caxias, por efeito da Balaiada, e a madrasta pediu-lhe que voltasse,
mas ele prosseguiu nos estudos graças ao auxílio de colegas,
formando-se em 1845. Em Coimbra, ligou-se Gonçalves Dias ao grupo
dos poetas que Fidelino de Figueiredo chamou de “medievalistas”.
À influência dos portugueses virá juntar-se a dos românticos
franceses, ingleses, espanhóis e alemães. Em 1843 surge a “Canção
do exílio”, um das mais conhecidas poesias da língua portuguesa.
Regressando
ao Brasil em 1845, passou rapidamente pelo Maranhão e, em meados de
1846, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde morou até 1854,
fazendo apenas uma rápida viagem ao norte em 1851. Em 46, havia
composto o drama Leonor de Mendonça, que o Conservatório do Rio de
Janeiro impediu de representar a pretexto de ser incorreto na
linguagem; em 47 saíram os Primeiros cantos, com as “Poesias
americanas”, que mereceram artigo encomiástico de Alexandre
Herculano; no ano seguinte, publicou os Segundos cantos e, para
vingar-se dos seus gratuitos censores, conforme registram os
historiadores, escreveu as Sextilhas de frei Antão, em que a
intenção aparente de demonstrar conhecimento da língua o levou a
escrever um “ensaio filológico”, num poema escrito em idioma
misto de todas as épocas por que passara a língua portuguesa até
então. Em 1849, foi nomeado professor de Latim e História do
Colégio Pedro II e fundou a revista Guanabara, com Macedo e Porto
Alegre. Em 51, publicou os Últimos cantos, encerrando a fase mais
importante de sua poesia.
A
melhor parte da lírica dos Cantos inspira-se ora da natureza, ora da
religião, mas sobretudo de seu caráter e temperamento. Sua poesia é
eminentemente autobiográfica. A consciência da inferioridade de
origem, a saúde precária, tudo lhe era motivo de tristezas. Foram
elas atribuídas ao infortúnio amoroso pelos críticos, esquecidos
estes de que a grande paixão do Poeta ocorreu depois da publicação
dos Últimos cantos. Em 1851, partiu Gonçalves Dias para o Norte em
missão oficial e no intuito de desposar Ana Amélia Ferreira do
Vale, de 14 anos, o grande amor de sua vida, cuja mãe não concordou
por motivos de sua origem bastarda e mestiça. Frustrado, casou-se no
Rio, em 1852, com Olímpia Carolina da Costa. Foi um casamento de
conveniência, origem de grandes desventuras para o Poeta, devidas ao
gênio da esposa, da qual se separou em 1856. Tiveram uma filha,
falecida na primeira infância.
Nomeado
para a Secretaria dos Negócios Estrangeiros, permaneceu na Europa de
1854 a 1858, em missão oficial de estudos e pesquisa. Em 56, viajou
para a Alemanha e, na passagem por Leipzig, em 57, o livreiro-editor
Brockhaus editou os Cantos, os primeiros quatro cantos de Os
Timbiras, compostos dez anos antes, e o Dicionário da língua tupi.
Voltou ao Brasil e, em 1861 e 62, viajou pelo Norte, pelos rios
Madeira e Negro, como membro da Comissão Científica de Exploração.
Voltou ao Rio de Janeiro em 1862, seguindo logo para a Europa, em
tratamento de saúde, bastante abalada, e buscando estações de cura
em várias cidades européias. Em 25 de outubro de 63, embarcou em
Bordéus para Lisboa, onde concluiu a tradução de A noiva de
Messina, de Schiller. Voltando a Paris, passou em estações de cura
em Aix-les-Bains, Allevard e Ems. Em 10 de setembro de 1864, embarcou
para o Brasil no Havre no navio Ville de Boulogne, que naufragou, no
baixio de Atins, nas costas do Maranhão, tendo o poeta perecido no
camarote, sendo a única vítima do desastre, aos 41 anos de idade.
Todas
as suas obras literárias, compreendendo os Cantos, as Sextilhas, a
Meditação e as peças de teatro (Patkul, Beatriz Cenci e Leonor de
Mendonça), foram escritas até 1854, de maneira que, seguindo Sílvio
Romero, se tivesse desaparecido naquele ano, aos 31 anos, “teríamos
o nosso Gonçalves Dias completo”. O período final, em que dominam
os pendores eruditos, favorecidos pelas comissões oficiais e as
viagens à Europa, compreende o Dicionário da língua tupi, os
relatórios científicos, as traduções do alemão, a epopéia Os
Timbiras, cujos trechos iniciais, que são os melhores, datam do
período anterior.
Sua
obra poética, lírica ou épica, enquadrou-se na temática
“americana”, isto é, de incorporação dos assuntos e paisagens
brasileiros na literatura nacional, fazendo-a voltar-se para a terra
natal, marcando assim a nossa independência em relação a Portugal.
Ao lado da natureza local, recorreu aos temas em torno do indígena,
o homem americano primitivo, tomado como o protótipo de brasileiro,
desenvolvendo, com José de Alencar na ficção, o movimento do
“Indianismo”. Os indígenas, com suas lendas e mitos, seus dramas
e conflitos, suas lutas e amores, sua fusão com o branco,
ofereceram-lhe um mundo rico de significação simbólica. Embora não
tenha sido o primeiro a buscar na temática indígena recursos para o
abrasileiramento da literatura, Gonçalves Dias foi o que mais alto
elevou o Indianismo. A obra indianista está contida nas “Poesias
americanas” dos Primeiros cantos, nos Segundos cantos e Últimos
cantos, sobretudo nos poemas “Marabá”, “Leito de folhas
verdes”, “Canto do piaga”, “Canto do tamoio”, “Canto do
guerreiro” e “I-Juca-Pirama”, este talvez o ponto mais alto da
poesia indianista. É uma das obras-primas da poesia brasileira,
graças ao conteúdo emocional e lírico, à força dramática, ao
argumento, à linguagem, ao ritmo rico e variado, aos múltiplos
sentimentos, à fusão do poético, do sublime, do narrativo, do
diálogo, culminando na grandeza da maldição do pai ao filho que
chorou na presença da morte.
Pela
obra lírica e indianista, Gonçalves Dias é um dos mais típicos
representantes do Romantismo brasileiro e forma com José de Alencar
na prosa a dupla que conferiu caráter nacional à literatura
brasileira.
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