domingo, 24 de maio de 2015

Marabá - 1 parte


Cumprimentos

Agradeço à oportunidade dada pela Casa de Cultura, para essa pequena análise de nosso bardo caixense. Se interessar a alguém. Disponibilizarei os textos lidos aqui e a análise em meu twitter & blog professoral (@aulasetextos e http://aulasetextos.com ).


Considerações

Por que se estudar Gonçalves Dias?
Marabá
Mme. Bovary c'est moi
Essa origem mestiça causou grande frustração na sua vida impedindo-o de se casar com Ana Amélia e que aparentemente o poeta jamais se recuperaria desse evento. A frustração experimentada por essa índia também é a mesma frustração experimentada pelo próprio poeta que é impedido do amor verdadeiro por sua origem mestiça.

Contexto

SERA, Tânia. Indianismo: Evasão E Participação No Romantismo Brasileiro in http://repositorio.unb.br/bitstream/10482/3731/6/ARTIGO_IndianismoEvasaoParticipacao.pdf <acesso em 20/05/2015>

Para podermos compreender o fenômeno literário do Indianismo, é necessário voltarmos alguns séculos para trás na História e vir mapeando o desenvolvimento dessa corrente do primeiro Romantismo brasileiro, a fim de podermos verificar sua identidade profunda com o nacionalismo que ocorreu nas primeiras décadas de nossa Independência e que não pode ser eliminado de uma análise sobre aquele período. E necessário, também, termos em mente que há duas correntes de influência paralelas nesse correr dos séculos, a saber: a literatura colonial do tipo exótico-ufanista, principalmente os poemas épicos do Barroco brasileiro (juntamente com sua prima próxima, a literatura de viagem),e a noção filosófica do ameríndio como um Adão em estado de pré-queda, espécie de embasamento teórico para o Americanismo que vai eclodir na França do começo do século XIX. Do ponto de vist a político, encontra-se aí uma enorme efervescência em seguida à Revolução Francesa, conforme já disse Carpeaux. É a época do liberalismo, tanto político quanto social, e até mesmo literário: "O Romantismo ... é o ... 'liberalismo em literatura'", diz Victor Hugo em seu prefácio a Hernani. É também, e sobretudo, a época em que camadas sociais antes reprimidas aspiram a uma faixa de poder. A burguesia luta por um lugar ao sol, e a ideologia dessa atitude vai refletir-se no movimento romântico. É essa mesma burguesia que, durante o Renascimento e as grandes descobertas, vai colocar seu olhar "civilizado" sobre os bárbaros das Américas e elegê-los como o ponto de partida para um neobucolismo necessário à nova ideologia financeiramente interessada de uma Europa em rápido processo de urbanização, que irá desembocar na Revolução Industrial e na Revolução Francesa do Século XVIII.Montaigne, Rousseau e Chateaubriand, cada qual com sua visão particular, forjam o arquétipo do novo Adão paradisíaco, a saber, o índio americano; o bon sauvage. O Americanismo de Chateaubriand — e mais tarde o de Cooper — chega-nos num momento em que o olhar dos viajantes mercantilistas já havia registrado o exotismo do ameríndio, a exuberância da natureza tropical, a virgindade e a extensão das terras brasílicas. Nossa épica barroca está cheia de exemplos do ufanismo com que a terra e a gente eram visualizadas pelos poetas. Desde Anchieta já se pode falar de uma visão nativista, ou melhor, indigenista do nosso índio. Por esse caminho seguem Santa Rita Durão, com seu Caramuru, ou Basílio da Gama n'0 Uraguai, e até mesmo Sebastião da Rocha Pita na prosa de seu barroquíssimo A História da América Portuguesa.
Fazendo com que as correntes paralelas que influenciaram nosso Indianismo se encontrem, o francês Ferdinand Denis, primeiro em 1824, depois em 182ó, publica livros em que fala de uma literatura brasileira. O Resumo da História Literária do Brasil (de 1826) é o primeiro documento de história literária mencionando não só uma literatura nossa, como sugerindo que ela poderia ser muito mais viçosa se seguisse o caminho indianista, agora que o país conseguiu uma situação ideal, pois desde 1822 se havia libertado de Portugal. O que vemos acontecer, nessa primeira metade do século XIX, é uma tentativa sistemática de erigir essa independência sobre bases sólidas, isto é, autenticamente nacionais. O nacionalismo será, então, o que dará o tom a todas as manifestações político-culturais no país; "a literatura romântica foi arma de ação política e social desde a independência" (Coutinho, 1976: 169). É também o momento em que vários países da Europa se estão formando como nação,
onde antes havia ducados e principados separados, como a Itália e a Alemanha, por exemplo. No Novo Mundo, é quando começam as guerras de Independência, inspiradas na dos Estados Unidos da América no final do século XVIII.Esse sentimento também chega ao Brasil. É preciso, portanto, "fundar" urgentemente uma literatura brasileira, não mais referida por estrangeiros, mas por filhos da nova terra independente. Se, no entanto, desde a época do Brasil colônia tivemos cantos celebrando as belezas e excelências da terra, estes são mais manifestações nativistas do que nacionalistas.

O terreno estando semeado pelas duas correntes — o exotismo ufanista, que possibilita o mito da terra propícia à literatura, e o arquétipo do bon sauvage, que vai desembocar no paradigma do homem perfeito -, elas acabam tocando-se e misturando-se no começo do Primeiro Reinado. Agora, só nos falta uma ideologia própria que, separando-se das matrizes européias, alcance vôo-solo. Essa manifestação de nacionalismo literário - o nosso Indianismo, que vai, grosso modo, de 1840 a 1860 - foi ideologicamente legitimada por Domingos José Gonçalves de Magalhães no seu interessantíssimo e curioso "Discurso sobre a Literatura do Brasil", publicado na revista Niterói, em Paris (!), no ano de 1836, e que pode ser considerado nosso primeiro manifesto romântico. Nesse ensaio, que deveria servir de introdução a uma história da literatura brasileira, que nunca veio à luz, o futuro Visconde de Araguaia lança as cinco premissas que permitirão ao jovem país criar um fundamento "iítero-ideológico" que lhe possibilitaria executar um programa inovador de cultura, não mais luso, mas euro-brasileiro. Um pouco o que Oswald de Andrade, quase um século depois, vai realizar no nosso Modernismo.
Nosso Indianismo vem, então, preencher requisitos do exotismo e do nacionalismo literários. Segundo Nelson Werneck Sodré, o fenômeno da idealização do índio, uma das características fundamentais daquela corrente do Romantismo brasileiro como manifestação literária, sobretudo na poesia, também existe desde o século XVI. Nos capítulos em que trata de Indianismo, na sua ainda bastante pertinente História da Li-teratura Brasileira, o historiador traça a trajetória da mitificação do aborígene na sociedade branca ocidental até o Século das Luzes, quando aparece a idéia do bon sauvage de Rousseau, seguindo-se a literatura americanista de evasão baseada nos heróis ameríndios de Chateau-briand, como já foi dito anteriormente.
José de Alencar, na prosa de ficção, e Gonçalves Dias, na poesia, são os dois maiores representantes do Indianismo. São os Primeiros Cantos, publicados em 1847, que vão popularizar de vez a tendência que outros poetas menores já manipulavam.
O vate maranhense é considerado até hoje como "o poeta nacional" (Martins, 1978: 348). Faz parte do que se convencionou chamar de a Primeira Geração Romântica, ainda com fortes influências da forma clássica, mas já com uma temática que reflete o país a emergir da sombra de Portugal. É ele quem começa oficialmente o Indianismo no Brasil, com a publicação da obra acima mencionada. Toda uma primeira parte é chamada de "Poesias Americanas", e o poeta vai conhecer enorme sucesso, entrando para o círculo restrito dos jovens escritores que freqüentavam o exclusivo Paço Imperial, como o próprio Gonçalves de Magalhães e Joaquim de Macedo, por exemplo. O Imperador Pedro II vai até mesmo pedir-lhe que faça alguns estudos etnográficos, a partir
do recém-fundado Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro de 1838 -, que resultam, por exemplo, na monografia "Brasil e Oceania", de 1856, curiosíssimo trabalho em que Gonçalves Dias compara os índios brasileiros e os aborígenes australianos, chegando à conclusão de que os nossos são infinitamente "melhores" que os outros, por sua docilidade e pela facilidade com que deixam os hábitos pagãos. Esse interesse pela etnografia é muito sintomático, pois mostra a enorme curiosidade despertada pela população indígena e seus costumes, embora, nessa época, o genocídio das populações autóctones americanas já estivesse praticamente consumado. Mas é a partir desses dados colhidos que se vai poder criar uma idealização do homem-índio-Adão primitivo, padrão de homem honrado e valente que pode ser, então, comparado ao cavaleiro medieval: "O indianismo de Gonçalves Dias ... é parente do medievismo coimbrão ... As Sextilhas de Frei Antáo ... [e] "O Trovador" (poemas medievistas), poder-se-iam considerar pares simétricos d'Os Timbiras, do "I-Juca-Pirama", ... pela redução do índio aos padrões da Cavalaria" (Cândido, 1975: 84).
Esse novo herói será extremamente popular, fornecendo — para o público fluminense e o das províncias o caldo de nacionalidade necessária para unir a grande euforia cívica que se segue à Independência sobretudo no Segundo Reinado, o acréscimo de algo genuinamente nacional: uma identidade cultural brasileira.

Composição

Gonçalves Dias (Antônio G. D.), poeta, professor, crítico de história, etnólogo, nasceu em Caxias, MA, em 10 de agosto de 1823, e faleceu em naufrágio, no baixio dos Atins, MA, em 3 de novembro de 1864. É o patrono da Cadeira n. 15, por escolha do fundador Olavo Bilac.
Era filho de João Manuel Gonçalves Dias, comerciante português, natural de Trás-os-Montes, e de Vicência Ferreira, mestiça. Perseguido pelas exaltações nativistas, o pai refugiara-se com a companheira perto de Caxias, onde nasceu o futuro poeta. Casado em 1825 com outra mulher, o pai levou-o consigo, deu-lhe instrução e trabalho e matriculou-o no curso de latim, francês e filosofia do prof. Ricardo Leão Sabino. Em 1838 Gonçalves Dias embarcaria para Portugal, para prosseguir nos estudos, quando faleceu-lhe o pai. Com a ajuda da madrasta pôde viajar e matricular-se no curso de Direito em Coimbra. A situação financeira da família tornou-se difícil em Caxias, por efeito da Balaiada, e a madrasta pediu-lhe que voltasse, mas ele prosseguiu nos estudos graças ao auxílio de colegas, formando-se em 1845. Em Coimbra, ligou-se Gonçalves Dias ao grupo dos poetas que Fidelino de Figueiredo chamou de “medievalistas”. À influência dos portugueses virá juntar-se a dos românticos franceses, ingleses, espanhóis e alemães. Em 1843 surge a “Canção do exílio”, um das mais conhecidas poesias da língua portuguesa.

Regressando ao Brasil em 1845, passou rapidamente pelo Maranhão e, em meados de 1846, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde morou até 1854, fazendo apenas uma rápida viagem ao norte em 1851. Em 46, havia composto o drama Leonor de Mendonça, que o Conservatório do Rio de Janeiro impediu de representar a pretexto de ser incorreto na linguagem; em 47 saíram os Primeiros cantos, com as “Poesias americanas”, que mereceram artigo encomiástico de Alexandre Herculano; no ano seguinte, publicou os Segundos cantos e, para vingar-se dos seus gratuitos censores, conforme registram os historiadores, escreveu as Sextilhas de frei Antão, em que a intenção aparente de demonstrar conhecimento da língua o levou a escrever um “ensaio filológico”, num poema escrito em idioma misto de todas as épocas por que passara a língua portuguesa até então. Em 1849, foi nomeado professor de Latim e História do Colégio Pedro II e fundou a revista Guanabara, com Macedo e Porto Alegre. Em 51, publicou os Últimos cantos, encerrando a fase mais importante de sua poesia.
A melhor parte da lírica dos Cantos inspira-se ora da natureza, ora da religião, mas sobretudo de seu caráter e temperamento. Sua poesia é eminentemente autobiográfica. A consciência da inferioridade de origem, a saúde precária, tudo lhe era motivo de tristezas. Foram elas atribuídas ao infortúnio amoroso pelos críticos, esquecidos estes de que a grande paixão do Poeta ocorreu depois da publicação dos Últimos cantos. Em 1851, partiu Gonçalves Dias para o Norte em missão oficial e no intuito de desposar Ana Amélia Ferreira do Vale, de 14 anos, o grande amor de sua vida, cuja mãe não concordou por motivos de sua origem bastarda e mestiça. Frustrado, casou-se no Rio, em 1852, com Olímpia Carolina da Costa. Foi um casamento de conveniência, origem de grandes desventuras para o Poeta, devidas ao gênio da esposa, da qual se separou em 1856. Tiveram uma filha, falecida na primeira infância.
Nomeado para a Secretaria dos Negócios Estrangeiros, permaneceu na Europa de 1854 a 1858, em missão oficial de estudos e pesquisa. Em 56, viajou para a Alemanha e, na passagem por Leipzig, em 57, o livreiro-editor Brockhaus editou os Cantos, os primeiros quatro cantos de Os Timbiras, compostos dez anos antes, e o Dicionário da língua tupi. Voltou ao Brasil e, em 1861 e 62, viajou pelo Norte, pelos rios Madeira e Negro, como membro da Comissão Científica de Exploração. Voltou ao Rio de Janeiro em 1862, seguindo logo para a Europa, em tratamento de saúde, bastante abalada, e buscando estações de cura em várias cidades européias. Em 25 de outubro de 63, embarcou em Bordéus para Lisboa, onde concluiu a tradução de A noiva de Messina, de Schiller. Voltando a Paris, passou em estações de cura em Aix-les-Bains, Allevard e Ems. Em 10 de setembro de 1864, embarcou para o Brasil no Havre no navio Ville de Boulogne, que naufragou, no baixio de Atins, nas costas do Maranhão, tendo o poeta perecido no camarote, sendo a única vítima do desastre, aos 41 anos de idade.
Todas as suas obras literárias, compreendendo os Cantos, as Sextilhas, a Meditação e as peças de teatro (Patkul, Beatriz Cenci e Leonor de Mendonça), foram escritas até 1854, de maneira que, seguindo Sílvio Romero, se tivesse desaparecido naquele ano, aos 31 anos, “teríamos o nosso Gonçalves Dias completo”. O período final, em que dominam os pendores eruditos, favorecidos pelas comissões oficiais e as viagens à Europa, compreende o Dicionário da língua tupi, os relatórios científicos, as traduções do alemão, a epopéia Os Timbiras, cujos trechos iniciais, que são os melhores, datam do período anterior.
Sua obra poética, lírica ou épica, enquadrou-se na temática “americana”, isto é, de incorporação dos assuntos e paisagens brasileiros na literatura nacional, fazendo-a voltar-se para a terra natal, marcando assim a nossa independência em relação a Portugal. Ao lado da natureza local, recorreu aos temas em torno do indígena, o homem americano primitivo, tomado como o protótipo de brasileiro, desenvolvendo, com José de Alencar na ficção, o movimento do “Indianismo”. Os indígenas, com suas lendas e mitos, seus dramas e conflitos, suas lutas e amores, sua fusão com o branco, ofereceram-lhe um mundo rico de significação simbólica. Embora não tenha sido o primeiro a buscar na temática indígena recursos para o abrasileiramento da literatura, Gonçalves Dias foi o que mais alto elevou o Indianismo. A obra indianista está contida nas “Poesias americanas” dos Primeiros cantos, nos Segundos cantos e Últimos cantos, sobretudo nos poemas “Marabá”, “Leito de folhas verdes”, “Canto do piaga”, “Canto do tamoio”, “Canto do guerreiro” e “I-Juca-Pirama”, este talvez o ponto mais alto da poesia indianista. É uma das obras-primas da poesia brasileira, graças ao conteúdo emocional e lírico, à força dramática, ao argumento, à linguagem, ao ritmo rico e variado, aos múltiplos sentimentos, à fusão do poético, do sublime, do narrativo, do diálogo, culminando na grandeza da maldição do pai ao filho que chorou na presença da morte.
Pela obra lírica e indianista, Gonçalves Dias é um dos mais típicos representantes do Romantismo brasileiro e forma com José de Alencar na prosa a dupla que conferiu caráter nacional à literatura brasileira.

Nenhum comentário:

Postar um comentário