A ROSA DO POVO
1-A poesia social de Drummond, em um processo de investigação lúcida, medita sobre o mundo que o cerca, analisando seu tempo, suas vicissitudes, sua matéria, seus conflitos. Das alternativas que se seguem, qual aquela que NÃO apresenta versos cuja temática revela esse traço social?
A) Este é tempo de partido,/tempo de homens partidos./Em vão percorremos volumes,/viajamos e nos colorimos./A hora pressentida esmigalha-se em pó na rua./ Os homens pedem carne. Fogo. Sapatos./ As leis não bastam. Os lírios não nascem da lei./ Meu nome é tumulto, e escreve-se na pedra.
ANDRADE, Carlos Drummond. “Nosso Tempo”
B) (…) apenas,sem saber por que,/como, para que,//tu vives: cadáver,/malogro, tu vives,/rotina, tu vives /tu vives, mas triste/duma tal tristeza/tão sem água ou carme, /tão ausente, vago,/que pegar quisera/na mão e dizer-te:/Amigo, não sabes/que existe amanhã?
ANDRADE,Carlos Drummond. “Uma hora e mais outra”
C) Nos áureos tempos/a rua era tanta./O lado direito/retinha os jardins./Neles penetrávamos/indo aparecer/já no esquerdo lado/que em ferros jazia./Nisto se passava/um tempo dez mil.
ANDRADE.Carlos Drummond. “Nos áureos tempos.”
D) As cidades podem vencer, Stalingrado!/Penso na vitória das cidades, que por enquanto é apenas uma fumaça subindo do Volga/Penso no colar de cidades, que se amarão e se defenderão contra tudo/Em teu chão calcinado onde apodrecem cadáveres,/ a grande Cidade de amanhã erguerá a sua Ordem.
ANDRADE.Carlos Drummond. “Carta a Stalingrado”.
2-A metalinguagem é um dos pontos mais altos da obra lírica “ A Rosa do povo”. Alguns poemas discutem onde está a poesia, outros apontam todas as considerações sobre o fazer poético, além daquelas que são pessimistas em relação à função da poesia ou à aceitação dela. Qual a alternativa a seguir se diferencia quanto à temática?
A) Não rimarei a palavra sono/com a incorrespondente palavra outono./Rimarei com a palavra carne/ ou qualquer outra, que todas me convém./As palavras não nascem amarradas,/elas saltam, se beijam, se dissolvem,/no céu livre por vezes um desenho,/são puras, largas, autênticas, indevassáveis. (C.A.D. “Consideração do poema”)
B) Chega mais perto e contempla as palavras./Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra/ e te pergunta, sem interesse pela resposta,/pobre ou terrível, que lhe deres:/Trouxeste a chave?(C.A.D. “Procura da poesia”)
C) Adeus: vamos para a frente,/recuando de olhos acesos./Nossos filhos tão felizes…/Fiéis herdeiros do medo,/eles povoam a cidade./Depois da cidade, o mundo./Depois do mundo, as estrelas,/dançando o baile do medo. ( C.D.A. “ O Medo”)
D) Penetra surdamente no reino das palavras./Lá estão os poemas que esperam ser escritos./Estão paralisados, mas não há desespero,/há calma e frescura na superfície intata./Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário./ Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.(C.D.A. “Procura da poesia”)
3- “Um sabiá
na palmeira, longe.
Estas aves cantam
um outro canto.” (“Nova canção do exílio” in A rosa do povo, Carlos Drummond de Andrade)
O fragmento acima traz um procedimento característico da criação literária, que é o aproveitamento de outros textos já existentes na Literatura. Como pode ser chamado esse procedimento? A qual texto o fragmento se refere e qual é o autor do texto referido?
a) plágio; “Canção do exílio”; Gonçalves Dias.
b) intertextualidade; “Canção do exílio”; Gonçalves Dias.
c) intertextualidade; “Canção do exílio”; Gonçalves de Magalhães.
d) contraste; “Velha canção do exílio”; Gonçalves de Magalhães.
A flor e a náusea
Preso à minha classe e a algumas roupas,
vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas, revoltar-me?
Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.
Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.
Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.
[…]
Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.
Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
ANDRADE, Carlos Drummond de. In “A rosa do povo”. Rio de Janeiro: Record, 2008.
4- A frase que inicia O capital, repercute também nestes versos do poema “A flor e a náusea”, de Carlos Drummond de Andrade:
Preso à minha classe e a algumas roupas,
Vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Nesses versos,
A) as mercadorias, convertidas em melancolias, libertam o indivíduo da prisão de sua classe.
B) as roupas brancas do poeta, diferentemente de sua classe social, simbolizam sua libertação.
C) os sentimentos melancólicos do poeta estão por ele ironicamente associados à condição de mercadorias.
D) de branco, o poeta caminha com absoluta inconsciência de seu lugar numa sociedade de classes.
5-Assinalar com V (verdadeiro) ou com F (falso) as afirmativas abaixo, sobre a “flor” referida nas estrofes finais do poema acima:
( ) simboliza a resistência à coisificação do homem nas grandes cidades, regidas pelo ritmo dos “negócios”.
( )irrompe com uma força inusitada, substituindo o tédio e a náusea pela esperança.
( )não consegue reverter o sentimento de tédio e de ódio que toma conta do eu-lírico do poema.
( )é apenas uma imagem para ressaltar que nada pode modificar o cenário desumano da cidade.
( )passa despercebida de muitos na rotina da cidade, embora o inusitado do seu nascimento.
O preenchimento correto dos parênteses, de cima para baixo, é:
A) V – F –V – V – F
B) V – V – V – F – F
C) V – V – F – F – V
D) V – F – F – V – V
6-Leia o seguinte fragmento do poema Procura da poesia, de Carlos Drummond de Andrade.
01. “Não faças versos sobre acontecimentos.
02. Não há criação nem morte perante a poesia.
03. Diante dela, a vida é um sol estático,
04. não aquece nem ilumina.
05. As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
06. Não faças poesia com o corpo,
07. esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso* à efusão lírica.
08. Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro
09. são indiferentes.
10. Nem me reveles teus sentimentos,
11. que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
12. O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.”
* contrário
Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as afirmações abaixo sobre o sentido do texto.
( ) As formas verbais do imperativo negativo (v. 01, 06 e 10) evidenciam que o poeta procura dissuadir aquele que queira fazer poesia sobre suas experiências pessoais e familiares.
( ) Trata-se de um poema sentimental que visa tornar a criação poética acessível a todos os leitores.
( ) Os versos 06 a 09 negam o corpo como área de motivação à criação poética.
( ) A poesia é algo que transcende a vida, o corpo, os pensamentos e os sentimentos.
A sequência correta de preenchimentos dos parênteses, de cima para baixo, é
(A) V – V – F – F.
(B) F – V – F – V.
(C) V – F – V – F.
(D) V – F – V – V.
Leia os textos a seguir e utilize-os para a solução das questões propostas.
TEXTO 1 – O Áporo1
Um inseto cava
cava sem alarme
perfurando a terra
sem achar escape.
Que fazer, exausto,
em país bloqueado,
enlace de noite
raiz e minério?
Eis que o labirinto
(oh razão, mistério)
presto se desata:
em verde, sozinha
antieuclidiana,
uma orquídea forma-se.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Antologia Poética / Carlos Drummond de Andrade; organizada pelo autor – 25ª ed. – Rio de Janeiro: Record, 1990.
1 ÁPORO – s.m. Problema difícil ou impossível de resolver; aporismo. // (Bot.) gênero de plantas da família das orquídeas, composto de várias espécies, todas herbáceas, de flores quase solitárias, ordinariamente esverdeadas. // (Zool.) Gênero de insetos himenópteros da família dos cavadores. (AULETE, Caldas. Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguêsa.- 5ª ed – Rio de Janeiro: Delta, 1968)
7- Considerando as definições para o vocábulo ÁPORO, temos como correta a seguinte interpretação para o poema de Carlos Drummond de Andrade – texto 1.
A) O inseto (homem) e o enfrentamento dos obstáculos do existir (labirinto) com dificuldade e cansaço, mas que, de repente, depara-se com possível sucesso (orquídea).
B) O inseto (poeta) que não consegue enfrentar o desafio de uma página em branco (labirinto) para redigir um poema (orquídea).
C) A orquídea (vida) que é prejudicada por ações repetidas (cava, cava) e incorretas (antieuclidiana) do próprio homem (inseto).
D) O labirinto (existência) visto pelo homem (inseto) como sinônimo de insegurança (antieuclidiana) e solidão ( em verde, sozinha).
Leia os excertos abaixo, extraídos do poema “Procura da Poesia”, do livro “A Rosa do Povo”, de Carlos Drummond de Andrade.
“Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.”
“Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?”
8- Assinale a afirmação correta sobre esses excertos.
A) Os versos 01 e 06 expressam uma técnica elaborada pelo poeta para facilitar a leitura da poesia moderna.
B) Os versos comprovam os múltiplos sentidos que as palavras possuem, quando pesquisadas no dicionário.
C) Os versos recomendam a utilização de uma única chave para decifrar as palavras de superfície enganosa.
D) Nos versos, o autor põe em destaque os poemas e as palavras, atribuindo-lhes autonomia, voz e sentimentos.
9-Considere as seguintes afirmações relativas ao livro A rosa do povo, de Carlos Drummond de Andrade:
I. Muitos poemas expressam as preocupações coletivas e individuais causadas pelo momento histórico em que o livro foi escrito. Assim, Drummond, nesta obra, pode ser considerado um poeta do seu tempo, que buscou no real que o envolvia razões sociais e estéticas para a sua literatura, possibilitando, com seus versos, uma reflexão sobre o presente e o futuro do mundo.
II. Os poemas foram escritos num tempo histórico marcante para o mundo e para o Brasil: o da II Guerra Mundial e do Estado Novo. Entretanto, os poemas não refletem sentimentos provocados pela realidade da época, pois Drummond não fazia poesia engajada. Para ele, fazer poesia era fazer experimentos de linguagem.
III. O livro estabelece uma relação harmoniosa com aquela contemporaneidade do mundo e do Brasil de 1945, ano de sua publicação, pois revela, nos poemas, a angústia, a dor, a náusea a que a vida estava submetida e apresenta a esperança como resistência ao caos totalizante que se instalara. Nesse sentido,
Drummond colocou sua estética a serviço da causa social.
Quais estão corretas?
A) Apenas I e II
B) Apenas I e III
C) Apenas II e III
D) Apenas I
10- Além do poema, considere também o texto a seguir.
O governo promoveu [em agosto de 1944] um comício para comemorar o segundo aniversário da entrada do Brasil na guerra. Tudo preparado meticulosamente, comércio fechado à tarde, e nenhuma vibração. Na grande faixa de pano erguida junto ao Teatro Municipal [de São Paulo], a inscrição “Ordem e disciplina”, indicando que o governo pensa menos em ganhar a guerra do que em salvar-se. (Carlos Drumond de Andrade)
(In: Carlos Guilherme Mota e Adriana Lopez. História e Civilização. São Paulo: Ática, 1995. p. 131)
Carlos Drumond de Andrade, em A rosa do povo, faz referência ao contexto da grande guerra mundial. Ele também mostrava preocupação com as questões políticas que ocorriam no cenário brasileiro daquele contexto histórico. No texto, Drummond demonstra
A) apoio incondicional à participação do governo brasileiro ao lado dos países que compunham o Eixo Berlim-Roma no final da guerra.
B) posicionamento contrário ao governo ditatorial vigente no país, que cerceava a liberdade de expressão e o direito à organização independente das normas do Estado.
C) contradição, pois aprecia a entrada do Brasil na guerra ao mesmo tempo em que tece crítica contundente ao governo pela falta de liberdade individual.
D) satisfação com o governo brasileiro por este despertar o nacionalismo dos brasileiros com a realização de grandes manifestações públicas.
Gabarito:
1- C
2- C
3- B
4- C
5- C
6- D
7- A
8- D
9- B
10- B
1-A poesia social de Drummond, em um processo de investigação lúcida, medita sobre o mundo que o cerca, analisando seu tempo, suas vicissitudes, sua matéria, seus conflitos. Das alternativas que se seguem, qual aquela que NÃO apresenta versos cuja temática revela esse traço social?
A) Este é tempo de partido,/tempo de homens partidos./Em vão percorremos volumes,/viajamos e nos colorimos./A hora pressentida esmigalha-se em pó na rua./ Os homens pedem carne. Fogo. Sapatos./ As leis não bastam. Os lírios não nascem da lei./ Meu nome é tumulto, e escreve-se na pedra.
ANDRADE, Carlos Drummond. “Nosso Tempo”
B) (…) apenas,sem saber por que,/como, para que,//tu vives: cadáver,/malogro, tu vives,/rotina, tu vives /tu vives, mas triste/duma tal tristeza/tão sem água ou carme, /tão ausente, vago,/que pegar quisera/na mão e dizer-te:/Amigo, não sabes/que existe amanhã?
ANDRADE,Carlos Drummond. “Uma hora e mais outra”
C) Nos áureos tempos/a rua era tanta./O lado direito/retinha os jardins./Neles penetrávamos/indo aparecer/já no esquerdo lado/que em ferros jazia./Nisto se passava/um tempo dez mil.
ANDRADE.Carlos Drummond. “Nos áureos tempos.”
D) As cidades podem vencer, Stalingrado!/Penso na vitória das cidades, que por enquanto é apenas uma fumaça subindo do Volga/Penso no colar de cidades, que se amarão e se defenderão contra tudo/Em teu chão calcinado onde apodrecem cadáveres,/ a grande Cidade de amanhã erguerá a sua Ordem.
ANDRADE.Carlos Drummond. “Carta a Stalingrado”.
2-A metalinguagem é um dos pontos mais altos da obra lírica “ A Rosa do povo”. Alguns poemas discutem onde está a poesia, outros apontam todas as considerações sobre o fazer poético, além daquelas que são pessimistas em relação à função da poesia ou à aceitação dela. Qual a alternativa a seguir se diferencia quanto à temática?
A) Não rimarei a palavra sono/com a incorrespondente palavra outono./Rimarei com a palavra carne/ ou qualquer outra, que todas me convém./As palavras não nascem amarradas,/elas saltam, se beijam, se dissolvem,/no céu livre por vezes um desenho,/são puras, largas, autênticas, indevassáveis. (C.A.D. “Consideração do poema”)
B) Chega mais perto e contempla as palavras./Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra/ e te pergunta, sem interesse pela resposta,/pobre ou terrível, que lhe deres:/Trouxeste a chave?(C.A.D. “Procura da poesia”)
C) Adeus: vamos para a frente,/recuando de olhos acesos./Nossos filhos tão felizes…/Fiéis herdeiros do medo,/eles povoam a cidade./Depois da cidade, o mundo./Depois do mundo, as estrelas,/dançando o baile do medo. ( C.D.A. “ O Medo”)
D) Penetra surdamente no reino das palavras./Lá estão os poemas que esperam ser escritos./Estão paralisados, mas não há desespero,/há calma e frescura na superfície intata./Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário./ Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.(C.D.A. “Procura da poesia”)
3- “Um sabiá
na palmeira, longe.
Estas aves cantam
um outro canto.” (“Nova canção do exílio” in A rosa do povo, Carlos Drummond de Andrade)
O fragmento acima traz um procedimento característico da criação literária, que é o aproveitamento de outros textos já existentes na Literatura. Como pode ser chamado esse procedimento? A qual texto o fragmento se refere e qual é o autor do texto referido?
a) plágio; “Canção do exílio”; Gonçalves Dias.
b) intertextualidade; “Canção do exílio”; Gonçalves Dias.
c) intertextualidade; “Canção do exílio”; Gonçalves de Magalhães.
d) contraste; “Velha canção do exílio”; Gonçalves de Magalhães.
A flor e a náusea
Preso à minha classe e a algumas roupas,
vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas, revoltar-me?
Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.
Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.
Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.
[…]
Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.
Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
ANDRADE, Carlos Drummond de. In “A rosa do povo”. Rio de Janeiro: Record, 2008.
4- A frase que inicia O capital, repercute também nestes versos do poema “A flor e a náusea”, de Carlos Drummond de Andrade:
Preso à minha classe e a algumas roupas,
Vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Nesses versos,
A) as mercadorias, convertidas em melancolias, libertam o indivíduo da prisão de sua classe.
B) as roupas brancas do poeta, diferentemente de sua classe social, simbolizam sua libertação.
C) os sentimentos melancólicos do poeta estão por ele ironicamente associados à condição de mercadorias.
D) de branco, o poeta caminha com absoluta inconsciência de seu lugar numa sociedade de classes.
5-Assinalar com V (verdadeiro) ou com F (falso) as afirmativas abaixo, sobre a “flor” referida nas estrofes finais do poema acima:
( ) simboliza a resistência à coisificação do homem nas grandes cidades, regidas pelo ritmo dos “negócios”.
( )irrompe com uma força inusitada, substituindo o tédio e a náusea pela esperança.
( )não consegue reverter o sentimento de tédio e de ódio que toma conta do eu-lírico do poema.
( )é apenas uma imagem para ressaltar que nada pode modificar o cenário desumano da cidade.
( )passa despercebida de muitos na rotina da cidade, embora o inusitado do seu nascimento.
O preenchimento correto dos parênteses, de cima para baixo, é:
A) V – F –V – V – F
B) V – V – V – F – F
C) V – V – F – F – V
D) V – F – F – V – V
6-Leia o seguinte fragmento do poema Procura da poesia, de Carlos Drummond de Andrade.
01. “Não faças versos sobre acontecimentos.
02. Não há criação nem morte perante a poesia.
03. Diante dela, a vida é um sol estático,
04. não aquece nem ilumina.
05. As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
06. Não faças poesia com o corpo,
07. esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso* à efusão lírica.
08. Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro
09. são indiferentes.
10. Nem me reveles teus sentimentos,
11. que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
12. O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.”
* contrário
Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as afirmações abaixo sobre o sentido do texto.
( ) As formas verbais do imperativo negativo (v. 01, 06 e 10) evidenciam que o poeta procura dissuadir aquele que queira fazer poesia sobre suas experiências pessoais e familiares.
( ) Trata-se de um poema sentimental que visa tornar a criação poética acessível a todos os leitores.
( ) Os versos 06 a 09 negam o corpo como área de motivação à criação poética.
( ) A poesia é algo que transcende a vida, o corpo, os pensamentos e os sentimentos.
A sequência correta de preenchimentos dos parênteses, de cima para baixo, é
(A) V – V – F – F.
(B) F – V – F – V.
(C) V – F – V – F.
(D) V – F – V – V.
Leia os textos a seguir e utilize-os para a solução das questões propostas.
TEXTO 1 – O Áporo1
Um inseto cava
cava sem alarme
perfurando a terra
sem achar escape.
Que fazer, exausto,
em país bloqueado,
enlace de noite
raiz e minério?
Eis que o labirinto
(oh razão, mistério)
presto se desata:
em verde, sozinha
antieuclidiana,
uma orquídea forma-se.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Antologia Poética / Carlos Drummond de Andrade; organizada pelo autor – 25ª ed. – Rio de Janeiro: Record, 1990.
1 ÁPORO – s.m. Problema difícil ou impossível de resolver; aporismo. // (Bot.) gênero de plantas da família das orquídeas, composto de várias espécies, todas herbáceas, de flores quase solitárias, ordinariamente esverdeadas. // (Zool.) Gênero de insetos himenópteros da família dos cavadores. (AULETE, Caldas. Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguêsa.- 5ª ed – Rio de Janeiro: Delta, 1968)
7- Considerando as definições para o vocábulo ÁPORO, temos como correta a seguinte interpretação para o poema de Carlos Drummond de Andrade – texto 1.
A) O inseto (homem) e o enfrentamento dos obstáculos do existir (labirinto) com dificuldade e cansaço, mas que, de repente, depara-se com possível sucesso (orquídea).
B) O inseto (poeta) que não consegue enfrentar o desafio de uma página em branco (labirinto) para redigir um poema (orquídea).
C) A orquídea (vida) que é prejudicada por ações repetidas (cava, cava) e incorretas (antieuclidiana) do próprio homem (inseto).
D) O labirinto (existência) visto pelo homem (inseto) como sinônimo de insegurança (antieuclidiana) e solidão ( em verde, sozinha).
Leia os excertos abaixo, extraídos do poema “Procura da Poesia”, do livro “A Rosa do Povo”, de Carlos Drummond de Andrade.
“Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.”
“Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?”
8- Assinale a afirmação correta sobre esses excertos.
A) Os versos 01 e 06 expressam uma técnica elaborada pelo poeta para facilitar a leitura da poesia moderna.
B) Os versos comprovam os múltiplos sentidos que as palavras possuem, quando pesquisadas no dicionário.
C) Os versos recomendam a utilização de uma única chave para decifrar as palavras de superfície enganosa.
D) Nos versos, o autor põe em destaque os poemas e as palavras, atribuindo-lhes autonomia, voz e sentimentos.
9-Considere as seguintes afirmações relativas ao livro A rosa do povo, de Carlos Drummond de Andrade:
I. Muitos poemas expressam as preocupações coletivas e individuais causadas pelo momento histórico em que o livro foi escrito. Assim, Drummond, nesta obra, pode ser considerado um poeta do seu tempo, que buscou no real que o envolvia razões sociais e estéticas para a sua literatura, possibilitando, com seus versos, uma reflexão sobre o presente e o futuro do mundo.
II. Os poemas foram escritos num tempo histórico marcante para o mundo e para o Brasil: o da II Guerra Mundial e do Estado Novo. Entretanto, os poemas não refletem sentimentos provocados pela realidade da época, pois Drummond não fazia poesia engajada. Para ele, fazer poesia era fazer experimentos de linguagem.
III. O livro estabelece uma relação harmoniosa com aquela contemporaneidade do mundo e do Brasil de 1945, ano de sua publicação, pois revela, nos poemas, a angústia, a dor, a náusea a que a vida estava submetida e apresenta a esperança como resistência ao caos totalizante que se instalara. Nesse sentido,
Drummond colocou sua estética a serviço da causa social.
Quais estão corretas?
A) Apenas I e II
B) Apenas I e III
C) Apenas II e III
D) Apenas I
10- Além do poema, considere também o texto a seguir.
O governo promoveu [em agosto de 1944] um comício para comemorar o segundo aniversário da entrada do Brasil na guerra. Tudo preparado meticulosamente, comércio fechado à tarde, e nenhuma vibração. Na grande faixa de pano erguida junto ao Teatro Municipal [de São Paulo], a inscrição “Ordem e disciplina”, indicando que o governo pensa menos em ganhar a guerra do que em salvar-se. (Carlos Drumond de Andrade)
(In: Carlos Guilherme Mota e Adriana Lopez. História e Civilização. São Paulo: Ática, 1995. p. 131)
Carlos Drumond de Andrade, em A rosa do povo, faz referência ao contexto da grande guerra mundial. Ele também mostrava preocupação com as questões políticas que ocorriam no cenário brasileiro daquele contexto histórico. No texto, Drummond demonstra
A) apoio incondicional à participação do governo brasileiro ao lado dos países que compunham o Eixo Berlim-Roma no final da guerra.
B) posicionamento contrário ao governo ditatorial vigente no país, que cerceava a liberdade de expressão e o direito à organização independente das normas do Estado.
C) contradição, pois aprecia a entrada do Brasil na guerra ao mesmo tempo em que tece crítica contundente ao governo pela falta de liberdade individual.
D) satisfação com o governo brasileiro por este despertar o nacionalismo dos brasileiros com a realização de grandes manifestações públicas.
Gabarito:
1- C
2- C
3- B
4- C
5- C
6- D
7- A
8- D
9- B
10- B
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